segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Há um fenômeno de dissonância cognitiva que envolve a Choosing Wisely Brasil.

Obviamente adoramos quando terceiros compartilham nossos materiais, e republicar o que geram é interessante: dá caras e vozes a nossas próprias mensagens. E é uma forma de agradecimento e carinho.

Não nos preocupamos em vasculhar perfis antes, uma vez que acreditamos em ideias, não em pessoas completas e imunes a análises imperfeitas ou incompletas. As minhas não são perfeitas, muito longe disso.

E acreditamos que ideias devem ser individualmente avaliadas, e aprimoradas - sem pressa.

Ainda assim, e não é raro, acontece de publicação imediatamente adiante trazer a divulgação de alguma intervenção duvidosa, para dizer o mínimo. Surge a ilusão terapêutica daquela pessoa! No exemplo que motivou esta reflexão, uma fisioterapeuta divulgou em Story uma recomendação nossa do tipo "menos Medicina" com mensagem bem legal. Seu Story imediatamente a seguir era sobre suprir aquele espaço que supostamente ficaria vazio com [o seu] Reiki.  

"Menos pode ser mais!". Mas o problema é sempre nos outros! Não se compactua com o “mais é melhor” - dos outros! O 'mês colorido' com mensagem a ser melhor trabalhada é sempre dos outros. Acontece que, ao mesmo tempo, o resultado de todos nós juntos não bate com a somatória das nossas auto-imagens individuais e corporativas. Este é um dos paradigmas de nosso movimento e de outros similares!

Na história da CWB, a partir dos debates mais internos (mais monitoráveis e avaliáveis, para explicar a amostra apenas), ninguém nunca se distanciou, por mais calorosos que tenham sido, em razão de discussões sobre temas “neutros” a elas. Só ocorreu quando envolvida a paixão histórica ou nova paixão de alguém... E já empilhamos algumas situações dessa natureza.  

Soluções? Há muito defendemos humildade e autocrítica. Que as pessoas devem reconhecer heurísticas, vieses e conflitos de interesse, e que isto ajudaria muito a minimizar o problema. Reconheço hoje, após algumas leituras recentes, que pode ser uma proposta de intervenção a partir da compreensão incompleta do funcionamento humano. Pode vir a ser uma abordagem de muito baixo valor! Outros têm defendido ênfase muito preponderante nas intervenções sistêmicas, como novos modelos remuneratórios. Isto seria um balde de água fria em movimentos como do nosso, pautados em "diálogos". Mesmo quando propusemos "colocar em prática recomendações", sei que não funciona bem em sistemas disfuncionais (questão vai do não interesse real em trabalhar desperdícios por desalinhamentos caricaturais à foco quase exclusivo em interesses ocultos, como custo-redução). Resposta natural seria rebater com "a nossa parte nós fizemos e fizemos bem. O que falta é terceiros fazerem CW bem feita". Tenho dúvidas, muitas dúvidas...  

sexta-feira, 8 de julho de 2022

Recebi convite para aula sobre Segurança do Paciente em universidade privada próxima de POA. Já ambíguo, comecei a preparar considerando repetição de abordagem que eu empregava muitos anos atrás, quando poucos falavam disso: coletânea de erros próprios e possíveis ensinamentos/soluções…

Sem muito esforço, fui anotando erros meus acontecidos em plantões recentes: Esquecimento de item de prescrição básico numa intercorrência noturna (algum cansaço, atenção desviada para tarefas que médicos não fazem em quase nenhum lugar do mundo); Demora de reação em situação básica (mais do que cansaço, obnubilação de alguns minutos - tipo como quando sai de um plantão por rota giratória que liga estacionamento do hospital à rua, na contramão / técnico querido percebeu a falha mas não ficou à vontade para apontar na hora); Pequei recente também em uma intercorrência em via pública por perda de consciência situacional, liderando uma verdadeira bagunça onde era para estar ocorrendo um atendimento certeiro. 

Pois bem...

Perdi a vontade quando assimilei não valer a pena discutir erro humano com exemplos pessoais em território de perfeitos infalíveis (e essa cultura só se solidificou desde os tempos de outrora). Ando preferindo correr na rua, onde eventualmente tropeço também...

Hoje, tudo acontece ainda em cenário onde burocratas assumiram a Segurança do Paciente com enxurrada de pseudosoluções ou soluções não testadas adequadamente, não havendo incentivos para tal. Em cenários onde raramente violações são punidas (e deveriam), além de que acabam tratadas com medidas abrangentes que acabam por punir os profissionais engajados e bem intencionados, que, por sua vez, seguem sem ajudas reais para os protegerem de erros humanos. 

Desisti completamente quando escutei sobre UTI pediátrica que estaria querendo ver plantonistas se dividirem durante à noite, restando sempre um acordado "de pé", porque no modelo anterior, em que podiam descansar em quarto ao lado, uma minoria não acha bom ser chamado pela enfermagem na madrugada e acaba por xingar as enfermeiras quando acontece. Não bastasse, não aceitam telefone dentro do quarto. Estes médicos deveriam ser repreendidos ou até demitidos, se insistência no comportamento (o que é = VIOLAÇÃO, coloca pacientes em risco).

Qual a solução pensada? Algo que além de punir os bons médicos, que buscariam atender na hora, ameaça pacientes com outros riscos: não é a toa que queremos que o mesmo médico que passou a visita da noite seja aquele a atender a intercorrência noturna - conheceu o paciente, ou assim espera-se. Aquele mesmo paciente que já é visto por um primeiro médico no turno da manhã, um segundo diferente no turno da tarde. Querem que quantos mais façam isto??? Quanto mais complexo e vulnerável o paciente, mais ele sofre por fragmentação do cuidado. 

Aumentar fragmentação instintivamente, sem avaliação crítica das consequências negativas não intencionais e mitigação, aumenta justamente os relevantes erros que envolvem perdas de informações importantes para tomadas de decisões assertivas críticas:

Aula de 2008

Numa UTI, a depender da estrutura e organização, esta ideia pode colocar um quarto e um quinto médico vendo o mesmo paciente em espaço de 24hrs, em média privando mais profissionais de descansar, estando eles sem demandas. E devem mesmo descansar! Muitos ainda seguem para outro trabalho com pacientes na manhã seguinte (o que não estou defendendo, ok?).

Postagem de 2017 - andamos em círculos...

Matéria do Instituto Brasileiro de Segurança do Paciente de 2017:

É dever do profissional de enfermagem chamar o médico em horário de repouso?

Spoiler: Não me importo de chamar o Enfermeiro na sala de lanches se considerar importante para o paciente. 


Poderia funcionar o modelo da divisão por horários com médico acordado em complexidades onde não é necessária a visita da noite. Aliás, isto já ocorre em enfermarias e IGUAL o médico precisa ser chamado por alguma tecnologia como celular ou bipe, pois costuma estar atendendo em algum outro lugar do [por vezes imenso] hospital. 

Alfredo Guarischi dedicou boa proporção de um dos primeiros eventos Safety com erros por fragmentação do cuidado (um dos palestrantes disto fui eu) e com impactos da privação do sono na segurança do sistema (palestra de Sami El Jundi sob a ótica da Saúde, outros trouxeram contribuições de setores como aviação comercial). Faleceu sem ver isso evoluir muito então. Em homenagem à nossa amizade, decidi não dar a aula e aproveitar a vida. No dia e hora que seria a aula, vou à bar com algum outro amigo. 

E é impossível não lembrar deste artigo: Está o movimento de segurança do paciente em perigo?

quarta-feira, 11 de maio de 2022

Choosing Wisely e busca por racionalidade podem causar burnout?

Há muito questiono valor dos “guerreiros da MBE”, geralmente vendedores de cursos e muito ativos em mídias sociais, quando expõem exemplos de coisas não baseadas em evidências feitas por colegas, entre outras estratégias inculpadoras. Eu mesmo já fiz isso algumas vezes, outras ainda escapam…

Questão é que é muito fácil fazer MBE e ser racional na teoria, em especial quando apontamos problemas em outras especialidades ou em cenários onde a discussão nos afeta diretamente pouco (em situações sem a “pele muito em jogo”). Em contrapartida, há aquelas em que a coisa não resta tão fácil assim não…

A reflexão agora surgiu da postagem abaixo, no Twitter 👇


Traz questões sistêmicas que, menos caricaturalmente, são prevalentes e abrangentes, em meio à cortina de fumaça que não favorece diálogos sobre elas, muito menos soluções.

Há alguns meses um estudante colaborador da CWB nos sinalizou que:

“Por vezes me pergunto se vale à pena trazer outros alunos para o projeto. Porque, depois que se aprende e se entende MBE, tamanho de efeito, incertezas, surgem muitas angústias e decepções com a medicina e os médicos em si. Não sei se quero levar essa angústia para outros colegas”.

Há nisto uma parcela de responsabilidade nossa. Porque não estamos sendo capazes de informar que, apesar de tudo, há relevantes avanços nas últimas décadas, mesmo que instáveis ou lentos - e que são parte disso. No cômputo geral, somos melhores hoje do que já fomos, e isto deveria estimular os colaboradores, em especial os jovens, não o contrário. Mas há razões outras concretas para sentimentos dessa natureza. E, se não soubermos valorizá-las e abordá-las, podem mesmo causar frustrações e burnout. Outro exemplo:

Esta semana, conversei com colega muito próximo a cerca de profundo desconforto que sentiu em uma atividade de congresso e adiante dela. Era um painel do tipo “como eu faço”. A cada rodada de assunto, um grupo de aproximadamente meia dúzia de médicos especialistas apontava o que era feito em suas instituições e os porquês. Quase tudo baseado em “experiência”. Quase nada norteado por construção científica do pensamento/raciocínio/conclusões. Existem tópicos realmente controversos, mas, naquele cenário, reinou uma heterogeneidade de práticas incompatível com as evidências já disponíveis.


Falamos sobre o mal-estar de valorizar MBE nestas situações e os caminhos possíveis:

a) Podemos optar por colocar as relações sociais ali envolvidas como alvo de nosso interesse primário. E não tensionar nada. Restaria apontar o que é feito na sua prática como mais uma descrição de experiência, como se não existissem nortes científicos bem alicerçados, como se existisse de fato alguma controversa a ser explorada. E não atritar nada! Foi o que o colega fez;

b) Podemos tentar apontar, em tom ainda muito preocupado com as relações sociais ali envolvidas, equívocos e armadilhas do modelo mental vigente. Mas, por onde começar????? Pelas limitações da “experiência clínica”? Pelas limitações dos relatos anedóticos? O fato é que não é possível nem querer começar. Seria preciso quantas horas de explicação para aqueles que partem de outras formas de pensamento que não a probabilística ou científica? Restam mesmo ‘a’ e ‘c’...

c) Alguns comunicadores da ciência defendem que existem momentos em que não há outra forma de fazer a não ser a incisiva, aguda, direta ao ponto. A mensagem lá no painel deveria ser dada aos consumidores finais da informação e não deveríamos nos importar com os sentimentos dos que pensam diferente no debate. Significaria colocar os expectadores como alvo do interesse primário e, na prática, ofender os demais debatedores. Sim, porque, queiramos ou não, sendo a mensagem curta e grossa, é assim que reagirão: acuados em ambiente onde era para brilharem. Naturalmente, ofendidos...

Na teoria, parece outra daquelas decisões fáceis, de um único caminho moral. Considerando-se que, sem tempo e sem a aceitação automática pelos envolvidos de que passariam a ser alunos também, e não mais debatedores no mesmo nível, é inevitável a geração de um cenário polarizado e confuso. Um cenário que naturalmente determinará mágoas, ressentimentos e reações. Precisamos compreender a razão pela qual acaba evitado pela maioria de nós. Ainda que sigamos engasgados, com sensação de inoperância, impotência - um caldo de cultura para burnout!

E não pensem que 'b' é apenas uma questão de tempo e bom papo. É complicado! Muito complexo! Hoje eu presenciei um atendimento onde havia dor e uma das propostas foi "acupuntura médica". Quem a defendeu criticou veementemente a acupuntura tradicional chinesa. Nada em tom que me pareceu inadequado. No entanto, tenho um grande amigo que acredita e faz a acupuntura tradicional chinesa e convicção de que se sentiria agredido ou magoado com as considerações. Um dos argumentos foi de que a acupuntura tradicional chinesa não respeita sequer a anatomia e a fisiologias médicas, complementando: "muitos não respondem então, e vêm a melhorar conosco, através da técnica adequada de neuromodulação". Sem entrar no mérito de quem tem a razão, se é que existe, uma das questões mais instigantes é que ambos os colegas acupunturistas são pessoas sensacionais e bem-intencionadas. E ambos enxergam benefício evidente de seus agulhamentos, caso contrário não aplicariam.

Uma coisa no cenário acima é você ser um Edzard Ernst, que tem na crítica às terapias alternativas sua principal atividade e campo de produção acadêmica - "amigos, amigos, negócios à parte". Outra coisa é você, como médico, avançar produtivamente nesses debates, em meio à relacionamentos sociais necessários e produtivos. Quem tiver uma solução outra que não gere atritos significativos, favor apontar! É muito arriscado falar a alguém que o que faz ou propõe pode ter pouco valor. 

Some-se isto acima ao cenário sistêmico que tanto dificulta racionalidade, e veremos que o furo é mais embaixo...


quinta-feira, 24 de março de 2022

Nunca me arrependo do que fiz para surgimento e promoção da Medicina Hospitalista no Brasil. Essa história, entretanto, por vezes me chateia ou consome.

Tenho vínculos com tudo que possa ter surgido pioneiramente no Brasil sobre o tema. De alguns desses espaços, já tiraram meu nome de publicações que contam a história. Sem problemas ou mágoas, envolve pessoas ou grupos com as quais não quero mais contato mesmo, nenhuma espécie de vínculo. Mas poderiam eliminar todos então...

Tenho pais quase octogenários que reclamam (a mim) de recorrente chegada no endereço deles de "lastros de outrora". Já pedi algumas vezes uma solução, como em e-mail de 2009 (sim, mais de uma década atrás) que consegui resgatar.

Em janeiro de 2021, houve resposta com
 
Certo,

Não fazia ideia deste registro na pref Poa 

Verei como corrigir o quanto antes e te aviso 

Mas, próximo da transição 21/22, chegou Guia para Pagamento da Taxa de Fiscalização, Localização e Funcionamento - TFLF2021 referente à organização braço do movimento inicial (talvez já tenha sido até abandonada já). Acredito que conste o endereço de meus pais em todos os documentos originais dos primórdios desde movimento no Brasil. 

Tive agora que gastar mais uma vez com isso. Porque não quero mais me envolver pessoalmente, contratei serviço cujo pacote envolve tentativa de resolução por diálogos / mediação (gostaria muito que fosse efetiva), se necessário notificação extrajudicial e até via judicial. É uma saga...

domingo, 23 de janeiro de 2022

Quanto a referência à Choosing Wisely na Nota Técnica 2/2022 - SCTIE/MS: Foi para ENCHER LINGUIÇA!

     A Choosing Wisely (CW) foi citada na Nota Técnica 2/2022 - SCTIE/MS:


     A CW é uma campanha multinacional para discutir sobreutilização de recursos em saúde. Sobreutilização inclui excessos que também se definem por "quantidade que excede os limites comuns de alguma coisa; o que é redundante; em que há copiosidade".

    De forma tragicômica, porque é parte do que a iniciativa combate, o nome CW entrou sem qualquer necessidade no documento, sugerindo utilização para "preencher espaço", fechar um número grande de pseudoexplicações. Qualquer um acostumado com a metodologia CW, ao ler a Nota Técnica, recomendaria como principal: 'Não escreva o desnecessário. O que não ajuda, na tomada de decisão, atrapalha". A não ser que o objetivo seja atrapalhar, encher linguiça para platéia não técnica...


     Por ser um exemplo de iniciativa que aponta o que NÃO FAZER, serviu de justificativa para escrevem que "os critérios metodológicos das Diretrizes Terapêuticas, de regra, diferem do que se observa de forma geral na iniciativa Choosing Wisely". Discurso pseudocientífico é assim: traz umas verdades até, que servem para fingir ser o assunto em questão mais complexo do que é. Ou simplesmente confundir, desviar o foco.

     Se é verdade que a iniciativa CW, de forma até mais do que geral, difere das tradicionais diretrizes e protocolos médicos, é também verdade que muitas Diretrizes Terapêuticas modernas utilizam sistemas que também contemplam “recomendações contrárias”: o clássico “Class III: No Benefit", presente em tantas diretrizes mundo afora.

     A questão central é outra: nem Choosing Wisely, nem Diretrizes Terapêuticas de qualquer natureza, possuem base independente para concluir ou dizer diferente do cômputo geral das evidências científicas, já amplamente disponíveis nos assuntos que geram a falsa polêmica atual. Basta observar a forma como a esmagadora das organizações científicas e instituições de saúde mais renomadas do mundo têm abordado a COVID-19.

     Questão secundária, de importância ainda enorme, é a referência do MS de que não há evidências suficientes para um posicionamento contrário. Quando, no início da pandemia, era verdadeira a informação de que o assunto era pouco estudado, por razões auto-explicativas, a resposta passava pelo ônus da prova. Hoje, conforme pode ser conferido em The WHO Therapeutics and COVID-19: living guideline, ou diretamente nos estudos independentes que o amparam, há evidência suficiente relacionada à falsa controvérsia. O MS, ao ignorar explicitamente a existência disto, de forma absurdamente caricatural na sua ridícula tabela 1, desloca claramente o debate para o terreno das crenças, única e exclusivamente. Para evitar falar em crime contra a humanidade.  

tabela 1

     Por tudo isto, a Nota Técnica 2/2022 - SCTIE/MS resta como peça clássica de folhetim pseudocientífico, clamando por máxima organização de todas as entidades médicas técnico-científicas como forma de minimizar o impacto negativo do atual momento na credibilidade da Medicina brasileira. 

sexta-feira, 7 de janeiro de 2022

A confusão entre os paradigmas individual e populacional é compreensível, mas já passou do ponto.

A confusão entre os paradigmas individual e populacional é compreensível. Olho para trás e vejo que, eu próprio, cometi erros de interpretação ainda na era anterior da Influenza (H1N1) - sobre vacinação inclusive, muito especialmente após o arrefecimento daquela epidemia. Acho ainda que, na época da sua fase mais quente, também a instituição onde eu atuava cometeu equívocos: os protocolos traziam quase que exclusivamente uma lógica de cuidado INDIVIDUAL.

Ok, "tudo bem", pensamento a gente molda, aprimora - ainda mais eu como médico generalista, não epidemiologista de formação específica.

A experiência da COVID-19 surgiu cheia de ineditismos, nem todos imediatamente percebidos. Esteve até o dia de hoje carregada de incertezas, em maior ou menor grau. Há profundas incertezas no horizonte novamente: será o fim através de contaminação em massa? Surgirá nova variante? Houve naturalmente novos equívocos de interpretação durante esta epidemia também então. @LuisCLCorreia admitiu em https://www.instagram.com/p/B-u-2XjHuuA/ sobre https://medicinabaseadaemevidencias.blogspot.com/2020/01/coronavirus-epidemiologia-do-medo.html. Uma coisa poucos meses depois da outra.

É normal, "tudo bem" novamente. Super-especialistas erraram, craques em modelos preditivos "falharam" (entre aspas, porque não é a palavra apropriada para quem entende o que sejam modelos preditivos e suas esperadas limitações).

Apavora-me, e cada vez mais, no entanto, em janeiro de 2022 😳, gente conhecida de nosso movimento Choosing Wisely aqui no Brasil e fora, insistindo na confusão, minimizando os impactos sistêmicos da pandemia na saúde. Prasad descarrilhou completamente. Analisando mais profundamente um dos casos nacionais, foi possível mapear um perfil que defende quase a história natural dos problemas de saúde. A única coisa que pode e deve ser trabalhada são os [ninguém discute que importantíssimos] determinantes sociais. Rechaça qualquer tipo de intervenção artificial ou controle externo, com critérios bastante controversos sobre o que é artificial e o que é natural, ou sobre a falsa dicotomia entre uma coisa ser necessariamente boa e a outra necessariamente ruim. Sobre controle externo, sofre fácil de ver influência de Foucault e sua análise do poder e da domesticação dos corpos que compõem o espaço social (não é bolsonarista então, atenção para este detalhe). A partir disto, problematiza demais estatinas, vacinas, máscaras e a causa raiz das mortes com teste para COVID positivo durante esses últimos dois anos.

É muito fácil ser médico 'less is more' assim. Basta um script padrão, nos mesmos moldes que ideólogos extremistas criticam outros vários temas. Quando faltam argumentos, desviam para humanização e empatia (apenas - criando outra falsa dicotomia). Caricaturalmente, tornam possível fazer medicina sem precisar ler profundamente artigo científico e o mar de evidência que o cerca para concluir sobre probabilidade a priori do resultado em foco. Chega nesse ponto, basta citar Ioannidis e lembrar que a maioria dos estudos são falsos. Não queremos fazer da CWB um movimento assim!

Certa vez, dei de presente a estudantes que se aproximaram prometendo colaboração o curso de MBE do Luis Correia. Passado um tempo, sem que assistissem, perguntei se não iriam. Disseram que o conteúdo era muito denso, denso demais, "quem sabe vídeos curtos de até 2 minutos por tópico". Deixaram de ser os colaboradores que desejamos no movimento. Nos bastidores da Choosing Wisely Brasil, buscamos um movimento diferenciado que aprofunde, que fuja do simplório. Para, somente depois, simplificar.

O simplório pode sujar tanto a "água" do movimento "less is more", que corremos o risco de jogar sua parte boa fora em meio a tanto rechaço que celebridades como Vinay Prasad tem gerado, numa clara confusão entre paradigmas individual e populacional, mas não apenas: entre o que é interpretação crua de evidência e injeção de valores e preferências meramente pessoias nelas, característica de líderes carismáticos inflexíveis
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