Recentemente tive dois casos interessantes em minha equipe, em uma instituição pública de referência, que ilustram bem o hospital como um ambiente mais do que complexo.
Esteve internada uma senhora com múltiplas comorbidades e um quadro de icterícia colestática, que foi transferida de outra equipe clínica já com algumas coisas realizadas e aguardando um exame de imagem. Havia feito uma CPRE que evidenciou um cálculo, o qual foi retirado, mas a paciente não apresentou melhora. Em outra CPRE não encontraram cálculos, mas havia descrição de estreitamento de colédoco. Enquanto aguardava uma colangioressonância, a icterícia progredia e a condição clínica geral da paciente piorava. Ao recebermos ela, discutimos o caso com as informações que encontramos disponíveis e mantivemos o plano. Passaram-se dias, nada de nos viabilizarem o exame, e fomos ficando desconfortáveis, para não dizer outras coisas... E eis que chega um estagiário novo na equipe que, ao escutar a passagem do caso, lembra que havia acompanhado a mesma paciente enquanto em equipe cirúrgica. “E ela tinha consigo um laudo de colangioressonância feita em outro hospital, por isso não há esta informação no sistema. Colangiocarcinoma!”, contou ele. Fiquei paralisado! Fosse isto, em se tratando de uma paciente com múltiplas comorbidades, para a qual cirurgia talvez não fosse mais o melhor tratamento, a desobstrução, já a partir da CPRE, talvez fosse a modalidade terapêutica de escolha, para melhorar a qualidade de vida e a dignidade da paciente.
Em outro caso, seguramos a alta hospitalar de uma paciente para realizar um Holter de 48hs, já que talvez demorasse muito para ser feito ambulatorialmente. Estava programado para ocorrer no final de semana. Na segunda-feira, descobrimos que fizeram o teste na paciente errada, pois haviam trocado uma das pacientes de leito.
Erros na troca de informações estão entre os mais comuns. Há aqueles que ocorrem quando pacientes se movem de um lugar para outro, outros ocorrem mesmo quando o paciente está parado, porque há muitas trocas que ocorrem entre os profissionais da saúde. A presença de todas estas trocas e transições torna crítico considerar como a informação é passada entre os profissionais e as áreas.
Como já disse Robert Wachter, "nos tornamos acostumados e paralisados por nossos erros, passando a considerá-los efeitos colaterais inevitáveis de uma guerra heróica de alta tecnologia que a despeito disto parece estar sendo ganha. É como se estivéssemos passado os últimos 30 anos construindo um carro esportivo extremamente potente e equipado, mas não tivéssemos investido um centavo ou segundo tendo certeza se ele possuía amortecedores, cintos de segurança ou airbags."
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