quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Segurança do Paciente: teoria versus prática

Teoria:


Prática (relato mantendo profissional notificador, hospital e pacientes em anonimato):

'Em meu hospital, certo dia eu cometi um erro, e notifiquei os responsáveis através de e-mail e mensagem abaixo:

"Hoje cometi um erro de dose. Como nem através do sistema, nem lendo diretamente o rótulo na ampola, consegue-se identificar prontamente quantas gramas por ml têm os sulfatos de magnésio disponíveis, e eu estava correndo para fazer uma simples regra de 3 (não sei se precisava, mas enfim...), errei e prescrevi dose excessiva. Mas muito induzido também por um push padrão que o sistema oferece, que está ainda com tempo de infusão inadequado".

A partir disto, sugeri melhorias, como acréscimo da informação gramas por ml ao prescritor (já que nos manuais encontra-se mais comumente a dose de Mg em gramas) e ajuste do push padrão, criando duas alternativas inclusive (uma para reposição de Mg especificamente, lenta. Outra com 2g de sulfato de magnésio em 20 minutos, tratamento de segunda linha para asma aguda grave).

As respostas que recebi oficialmente foram reclamando de minha postura, ou dando informações que não interessavam, como quem informou o push padrão errado. Supervisor assistencial de sistemas escreveu ainda:

"De qualquer forma, vale sempre lembrar que a tela de rotina é apenas uma máscara para facilitar, podendo a qualquer momento o prescritor alterar os dados da solução clicando em detalhe e ajustando". Leia-se: burro incompetente, se havia um erro, cometestes outro em cima.

Esta foi minha resposta, depois disto nunca mais notifiquei na instituição:

"Pessoal, olha só, muito abertamente:
Um sistema que busque melhorias pelo apontamentos de equívocos somente sobrevive se brincarmos com os erros, se acharmos graça do erro do outro e do próprio erro, claro que sem perder o foco do porquê estamos nesta.
Tenho estado cada vez mais retraído para apontar coisas na casa...
Se interessa ao grupo, esta semana errei pra caramba, são pacientes ainda hospitalizados, então as provas estão todas lá.
Do seu xxxxxx não vi um resultado de cultura. Por sorte, quando visto, 48hrs depois da liberação, a conduta não necessitava alteração. Mas, fosse diferente, a história poderia ter sido diferente (já sugeri algumas vezes uma forma de melhor sinalizar isto para os médicos assistentes).
Já com xxxxxx foi pior. Suspeitei de trombose na perna (achando baixa a probabilidade, é verdade) e não só não deixei o pedido do exame que registrei intenção de pedir, como não deixei sequer heparina profilática (não havia, e não acrescentei, achando que havia). Outro colega encontrou dois dias depois clínica altamente sugestiva (entrou um colega em meu lugar no final de semana) e ecografia feita com atraso no domingo confirmou TVP. A paciente seguia sem profilaxia, iniciou diretamente anticoagulação plena."

Como resolver ou mitigar estas questões?'

O desafio real não é saber o que deve ser feito, mas driblar as armadilhas da vida que nos afastam disto. Muito mais amplo e desafiador. 

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