Há que se ter bastante cuidado ao compará-los, e a figura abaixo ilustra muito bem a razão:
Via de regra, todas as principais alternativas disponíveis adicionam alguma vantagem aos sistemas de saúde - elas têm surgido justamente como resposta à grave crise que os afeta mundialmente. Muitas delas, no entanto, definitivamente não representam forma de valorizar a atuação médica generalista, umas das principais conquistas do movimento de Hospital Medicine, pelo menos na minha perspectiva.
Tenho martelado que alguns hospitais têm usado de médicos não como hospitalistas, mas como membros de equipes de plantonistas que atuam servindo de retaguarda para o modelo médico tradicional. Modernamente, estimulam que o façam adotando uma "filosofia de resposta rápida". Como sempre, há vantagens, desvantagens e limitações. Hospitais que não possuem quem veja os seus doentes complexos enquanto médicos assistentes trabalham em consultórios localizados no outro lado da cidade estariam, indiscutivelmente, aumentando segurança dos pacientes. Desvantagens em relação ao modelo de Medicina Hospitalar: fragmentação da assistência intra-hospitalar, coordenador segue fora do hospital, aumento de custos, quem trabalha dedicado ao hospital não acaba tão valorizado.
No Brasil, até hoje, não podemos empregar midlevel providers (physician assistants e nurse practitioners), movimento que cresce exponencialmente nos EUA. Esta história de ter médicos servindo de retaguarda para os médicos assistentes que coordenam o cuidado de longe (nenhuma novidade, diga-se de passagem) mais parece o movimento de midlevel providers do que o de Hospital Medicine. O problema é que na "onda da resposta rápida" estamos agora estimulando uma categoria de médicos de segunda linha para servir de retaguarda para os que conquistaram "um lugar ao sol". Isto também não é novidade, e já acontece, por exemplo, com cirurgiões gerais que saem da Residência Médica e não conseguem nada além de auxílios por muitos e muitos anos.
Alguns poderiam defender que, para os pacientes, melhor um jovem médico já especialista do que um physician assistant para executar estas funções de retaguarda. O assunto é picante e, nos EUA, há algumas publicações recentes que corroboram este ponto de vista e estimulam ainda mais o debate sobre o movimento dos midlevel providers, como por exemplo:
Tsai C, Sullivan AF, Ginde AA, Camargo CA. Quality of emergency care provided by physician assistants and nurse practitioners [compared with that provided by physicians] in acute asthma. Am J Emerg Med. 2010;28:485-491.
After adjustment for patient mix, unsupervised MLPs were less likely to administer inhaled beta-agonists within 15 minutes of ED arrival (odds ratio [OR], 0.2; 95% confidence interval [CI], 0.1-0.7), less likely to prescribe systemic corticosteroids in the ED (OR, 0.4; 95% CI, 0.2-0.9), and more likely to prescribe inappropriate antibiotics at discharge (OR, 2.1; 95% CI, 1.1-4.1), as compared with physicians. Overall, their composite guideline concordance score was lower than that of physicians (-6 points; 95% CI, -9 to -3 points). Supervised MLPs provided quality of care similar to that of physicians.Larkin GL, Hooker RS. Patient willingness to be seen by physician assistants, nurse practitioners, and residents in the emergency department: does the presumption of assent have an empirical basis? Am J Bioethics. 2010;10(8):1-10.
Physician assistants (PAs), nurse practitioners (NPs), and medical residents constitute an increasingly significant part of the American health care workforce, yet patient assent to be seen by nonphysicians is only presumed and seldom sought. ED patients are generally unwilling to be seen by PAs, NPs, and residents. While seldom asked in practice, 79.5% of patients fully expect to see a physician regardless of acuity or potential for cost savings by seeing another provider. Patients are more willing to see residents than nonphysicians.
Percebe-se na avaliação acima que pacientes preferem inclusive médicos residentes à midlevel providers. Isto dá amparo para o tipo de adaptação que tem sido proposta no Brasil em relação a utilização do termo "hospitalista" - seria ele um "super-residente". Traria ganhos, sem modificar o status quo. Cabe reforçar que plantão clínico em si não é nenhuma novidade. O que está gerando a confusão de conceitos atualmente vista em nosso meio na disputa das organizações por caracterizarem inovação são os tais dos "sistemas de resposta rápida", pouca comprensão do que representam e as diversas maneiras de aplicá-los (até mesmo através de [verdadeiros] hospitalistas).
Mas qual seria o custo de contratar profissionais não hospitalistas para fazer "resposta rápida" em enfermarias que não disponhem sequer de uma equipe própria de PCR? Quem pagará esta conta, por mais que em tese aumente segurança? Intuitivo, não se optando pelo regime de Medicina Hospitalar, é montá-las se utilizando de médicos que já são funcionários do hospital, tal como os intensivistas, ou eventualmente os emergencistas.
Hospitais que já possuem um plantão clínico podem até tentar que atuem na filosofia de resposta rápida (e devem), mas lamento dizer que esta discussão de Times de Resposta Rápida ganhou força justamente porque plantões clínicos já vem falhando neste quesito há muito tempo, sendo cada vez mais claro que aspectos cognitivos-comportamentais explicam isto ("dificilmente se lava carro alugado"), e que não necessariamente ocorreu "gestão inadequada de todos que me antecederam" - uma expressão que tem sido eventualmente empregada por gestores de TRR's empolgados com seus [muitas vezes esperados] resultados iniciais.
E se não bastasse isto, plantões clínicos tradicionais (ou não) jamais representarão uma carreira médica e uma oportunidade de real valorização do médico clínico. Alternativas outras que partem da enfermaria são midlevel providers sob supervisão de corpo clínico tradicional ou a própria Medicina Hospitalar!
Isto tudo tem me feito refletir inclusive sobre minha posição em relação ao Ato Médico:
Em recente matéria na Folha de São Paulo, comentam sobre uma iniciativa da Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina estimulando a criação de sistemas híbridos de saúde, em que o trabalho em equipe seja mais valorizado e ocorra maior divisão de tarefas entre as profissões. Talvez seja mesmo a hora das entidades médicas, em especial o Conselho Federal de Medicina, rediscutirem a postura de trabalhar o conceito de ato médico amplo demais. Até bem pouco tempo eu não enxergava desta forma, mas começo a perceber que pode representar um "tiro no pé". Com a natalidade médica que existe e que só cresce, não vai ser difícil imaginar muito em breve a reprodução do movimento de "midlevel providers" no Brasil usando de médicos com até duas especialidades, tendo feito mais de 10 anos de formação.
Ao invés de ver hospitais sub-empregando clínicos para atender requisitos mínimos de segurança, preferiria vê-los aumentando a relação de enfermeiros por leito e melhorando o treinamento deles. Hospitalistas? Também, é claro! Mas para quem pode, não apenas para quem quer. Hospitais precisam aprender que, em relação ao melhor modelo, "there is no one-size-fits-all formula".
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