sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Reaqueceram o paradigma do paraquedas, e alguns continuam não entendendo.

Ontem recebi mensagem com a seguinte frase, trazida junto de artigo recém publicado no BMJ:

"Para vocês que querem ensaio clínico randomizado para tudo”. 



Seria uma tirada de mestre, tivesse surgido uns 10-15 anos atrás!


A diferença é que os gênios de 2003 se propuseram a uma revisão sistemática, não tendo achado ensaios clínicos randomizados (ECRs), ironizando aqueles que os reivindicam para tomada de decisões ÓBVIAS. Já os atuais, definitivamente pouco criativos e um tanto quanto ambíguos, simulam um ECR onde dizem ter conseguido randomizar indivíduos para saltar de aeronaves no solo apenas, não percebendo diferenças entre usar e não usar paraquedas. 

Gordon C S Smith e Jill P Pell, autores da verdadeira sacada, continuam atuais. Seus "achados" mantêm veracidade e aplicabilidade. Seguem gênios. Sabe-se, no entanto, que representam conclusão restrita ao que realmente é ÓBVIO. E a maioria das coisas em saúde não é*, sendo uma das explicações a elevada complexidade dos sistemas biológicos.

Most medical practices are not parachutes: a citation analysis of practices felt by biomedical authors to be analogous to parachutes.

Quanto ao colega que me enviou a mensagem, infelizmente ainda não entendeu. Nem que não basta ECR. Nem que nem tudo é óbvio. Nem que, mesmo na ausência da obviedade, é possível tomar decisões sem ensaio clínico. E mesmo que disséssemos que não deveria ocorrer, só não aconteceria se deixássemos de ser humanos. A mente humana reage assim naturalmente. A minha inclusive. 

Então, queres fazer sem certeza maior, por seja lá qual razão? Legítimo! Desde que tu não sejas um médico atuando no corpo de outra pessoa, com probabilidade de riscos (NNH), e fazendo o paciente entender COMO SE um ECR positivo de alta qualidade existisse, ou omitindo a incerteza intrínseca da ação proposta. 

Basta transparência e um pacto adequado entre médico e paciente/responsável, impreteríveis no contexto de questões eletivas. Se a decisão partir de honestidade, não há necessariamente problema maior. Eu próprio adoto condutas do tipo. A questão não é ser aficcionado por ECR e inflexível versus o contrário. O errado é criar falsas expectativas, vender ilusões. Quase apenas isto. E um ECR mal conduzido ou mal interpretado pode resultar no mesmo fenômeno, provocação direta ou indireta dos autores do mais recente do BMJ.

Quanto ao ser ou não ÓBVIO, não esqueçamos como o senso comum já nos enganou em diversas áreas do conhecimento, sendo a Medicina uma delas, com exemplos que passam pela Talidomida e a terapia de reposição hormonal no climatério. Diversas tentativas de prever, gerenciar ou manipular sistemas biológicos já nos pregaram inúmeras peças, além de que o conhecimento é modificável e tudo que não devemos fazer é ficar presos a crenças, chamando de óbvio aquilo em que queremos acreditar. Meus amigos Luis Correia e Robert Jannet ilustram um pouco disto abaixo:  

quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

O moderno movimento de segurança do paciente e o direito da saúde.

A ligação entre a compensação do lesado e a culpa do faltoso é brilhante em sua simplicidade e funciona razoavelmente bem quando aplicada a muitos segmentos da atividade humana. Infelizmente a Saúde não é um deles.


Material de link contido no texto:


O moderno movimento de segurança do paciente e o direito da saúde. from Guilherme Barcellos

Um aspecto da discussão trazida é a judicialização. Outro é relacionado às pressões não assertivas que os profissionais da ponta sofrem, muitas vezes na ausência de razoáveis condições de trabalho. São empresas onde a única coisa que conta é alcançar o que se espera que seja alcançado: e não é qualidade ou segurança do paciente.

Em palestra de Clóvis de Barros Filho, teria falado, em contexto que acredito aproxime-se:
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