quarta-feira, 25 de agosto de 2021

O que "os Rolling Stones" podem ensinar a médicos que enfrentam a infodemia e a desinformação na pandemia?

Como médico na pandemia, vejo frequentes barbaridades em redes sociais e WhatsApp. No início, sentia-me obrigado a confrontá-las, principalmente entre conhecidos. Considerava um "dever cívico". 

Um grande aprendizado que o amadurecimento na pandemia proporcionou foi não mais dar atenção, em especial ao envolver questões amplamente divulgadas em veículos tradicionais de saúde, como sites de instituições médicas de reconhecimento internacional. Demorei um pouco para abandonar conselhos gratuitos aos parentes e amigos mais próximos, mas já superei também. E são aprendizados para levar para a vida de médico adiante da pandemia. Aliás, as "bases teóricas" já existem há muito mais tempo, mas somente a infodemia e a desinformação na pandemia fizeram-me enxergar. 

Por que não tentar mudar conhecidos que não querem mudar, quando isto estiver te afetando negativamente?

Da mesma forma que a maioria das hipóteses médicas não vingam (material complementar aqui e aqui), e, quando vingam, são de alcance limitado (material complementar aqui e aqui), a maioria dos pacientes que não assumem posturas mais comprometidas com a própria saúde e bem-estar sobrevivem. Até que morrem. Mas, somente pelo fato de que somente morremos um vez, resta óbvio que, probabilisticamente falando, viver é mais provável em quase todo cenário clínico preventivo ou mesmo ambulatorial.

Vejamos exemplo da doença coronária

O ISCHEMIA Trial arrolou pacientes com doença coronária estável e teste de isquemia positivo. Houve um grupo com seguimento mais conservador e ajuda a entender o prognóstico destes pacientes sem que saíamos desentupindo como que em arco-reflexo suas artérias coronárias:


Sem entrar no mérito de que a diferença acima (quando aparente) não apresentou diferença estatística, temos ali um braço tratado conservadoramente por longos 5 anos e as consequências disto ao longo do período: menos de 20% apresentou morte cardiovascular, infarto do miocárdio ou hospitalização por angina instável. Em outras palavras, a grande maioria destes pacientes (~ 8 em cada 10) sobreviveu com "check-up alterado". Para o leigo entender: não é que nada deve ser feito quando a alteração é identificada. Mas, de um jeito ou de outro, muitos pacientes simplesmente sobrevivem, a maioria simplesmente sobrevive. Até que descompensa. Até que morremos. Neste ínterim, acumulamos auto-enganos, acreditando em picaretas e picaretagens diversos, em super-alimentos, em remédios revolucionários (conteúdo complementar no vídeo imediatamente abaixo). E nos desviamos das coisas que realmente podem impactar mais fortemente em nossa saúde ou, pelo menos, em nossa qualidade de vida, mas são difíceis mesmo. Muito difíceis! Não bastasse, não vêm com garantia.



Já o EXCEL Trial acompanhou, a partir de seus critérios de inclusão, pacientes com anatomia coronária ainda mais complicada. A maioria dos pacientes se manteve vivo ao final de 3 anos. Discutimos recentemente seus achados através da provocação: Como assim o melhor tratamento pode não ser o mais indicado?

Mas, puxa, assim ainda é muito difícil para eu entender! Bom, quem sabe através dos Rolling Stones?


O lendário baterista Charlie Watts, é público e notório, enfrentou longos anos onde seus demônios foram nada menos do que álcool e heroína:



Em 2004, foi diagnosticado com câncer de garganta. Havia fumado muitos anos. Sobreviveu. 

E o mais incrível é que Watts, a quem queremos aproveitar para prestar homenagem, teve um dos históricos de saúde mais saudáveis entre os integrantes dos Rolling Stones, ainda vivos. Por serem famosos, chamam atenção. Mas muito é viés de confirmação.





Então, dentro do possível, relaxemos. Especialmente os profissionais a quem a infodemia e a desinformação na pandemia não têm feito bem. Se não podemos salvar o mundo, a maioria dos nossos parentes e amigos que tomam Ivermectina para adotar comportamentos de risco ainda deve sobreviver. A maioria que não se vacina idem (sem perceber as nefastas consequências em cascata da medíocre, e muito pouco solidária, decisão). Embora não precisasse pandemia para explicar isso! A maioria dos nossos parentes e amigos que se lambuzam (muitas vezes de verdade) com proteções ilusórias enquanto neglicenciam questões importantes de saúde e bem-estar irá sobreviver. Até morrer, o final comum de todos nós. Mas, normalmente, muitas vezes aos trancos e barrancos, simplesmente sobrevivemos. E cada vez mais:

Clique na imagem e leia sobre longevidade e escolhas sábias.