terça-feira, 23 de outubro de 2018

O hospitalista como “dono” do paciente no hospital e porque a ideia não cola nem mesmo em algumas discussões no seio do próprio movimento.

Antes de qualquer coisa, o fato ocorre porque o significado buscado para a palavra dono não é compreendido, nem mesmo utilizando-se de analogias com “maestro” ou “argamassa” da assistência hospitalar. Se por um lado o único verdadeiro dono do paciente deve ser ele próprio (eventualmente seus familiares), mesmo que o conceito fosse aplicado na intenção única de referir-se ao profissional que está liderando o caso, é certamente algo dinâmico ou variável, se de fato o sistema estiver centrado no paciente. Percebo, sem dificuldades ou constrangimentos, que em determinados cenários de reabilitação e cuidados paliativos, a liderança do caso é de enfermeiros e fisioterapeutas, com médico na retaguarda. Os donos ou maestros seriam eles.

Mas porque mesmo no seio do movimento de MH existem profissionais atuando de formas bastante heterogêneas (vide discutíveis subtipos de hospitalista em Uma boa razão para bem delimitar o hospitalista: definição do core business, da “sacada” do negócio), não faltam contrapontos, sempre tentando calibrar o termo hospitalista para encaixar-se na perspectiva de quem o está definindo.
É nesse momento que alguns profissionais que atuam exclusivamente em Times de Resposta Rápida ou mesmo plantões clínicos tradicionais argumentam: “trato todo o paciente que atendo como se dono fosse, com total dedicação e comprometimento, mesmo que o atenda por alguns minutos apenas”.
Mas dono, no sentido que tento dar, nada tem a ver com grau de comprometimento, ou mesmo percepção de autonomia. Comprometimento máximo eu sempre tento ter quando faço simples plantões esporádicos. Entretanto, o sentido que busco trazer talvez possa ser melhor ilustrado por situação que enfrentei recentemente em um deles, já que por descrição direta não tenho conseguido.
Fiz admissão de paciente idosa após procedimento cirúrgico. Transcorreu bem, e paciente não necessitava de nenhum suporte orgânico, mesmo não invasivo. Estava completamente estável, conversava normalmente. Mas não sabia referir completamente medicações de uso crônico, muito menos doses. Na folha anestésica, havia as medicações, algumas  ilegíveis – doses não. Familiares não estavam disponíveis. Do médico assistente (responsável primário pela hospitalização), não encontrei nenhum registro. É certamente muito ocupado, e isso não é uma ironia. Mas este tipo de informação por vezes é ideal quando chega o quanto antes.
Fiz o que estava ao meu alcance, com empenho e humanização. Mas o que seria ser dono da paciente então, já que não resume-se também ao simples nome que consta como responsável no sistema do hospital? Apenas um sentimento de atuar como se proprietário fosse (no sentido positivo, não de dominação), distanciando-se de como agimos habitualmente com carros alugados, faz do médico o dono que queremos definir?
Ser dono no hospital é ser responsável por todas as demandas do paciente, complexas na grande parte das internações nos dias de hoje – do seu início ao fim, ao longo do continuum, com visão panorâmica e integradora. Isto inclui registros em prontuários que representem condição mínima para que o profissional possa ser visto como argamassa que uni toda a equipe multidisciplinar e os chamados especialistas focais (cardiologistas, pneumologistas, etc). E é dependente de posicionamento médico estratégico, não apenas boa vontade. Posicionamento esse que não é característica de modelos como TRR’s, por melhor e mais importantes que possam ser. Ser dono não é nenhum privilégio outorgado por antecipação, muito pelo contrário. Ser dono é, no final do mês, ter dado conta de tarefas e exigências de um hospital moderno. Não é sentir-se dono, mas merecer ser chamado como tal. E o merecimento máximo só é atingido com mais forte horizontalidade e integralidade do que modelos tradicionais ou certas modernidades que parecem “colchas de retalhos” possibilitam, em tratado-se, principalmente, de pacientes multimórbidos.

terça-feira, 9 de outubro de 2018

Uma boa razão para bem delimitar o hospitalista: definição do core business, da “sacada” do negócio.

Questionei recentemente um pessoal amigo de SP, que inclusive possui hospitalista, sobre o uso do termo além da definição. Justificaram que são uma turma jovem que entrou no hospital juntos, e que compartilhar um nome reforça o sentimento de grupo. Alguns hospitalistas "de fato" fazem ainda plantões em UTI e estendem a denominação para hospitalista intensivista - sem ter especialização em Medicina Intensiva. Explicaram que os nomes valorizam, dão destaque. Entretanto, sabemosque internistas podem trabalhar em UTI, mas não deveriam chamar-se de intensivista. E há razões para tal. Ou não?

Mais recentemente, escutei algo parecido de parceiros do PR. Atuam de hospitalistas e exercem ainda várias atividades complementares, o que pode ser ótimo e, no caso deles, está sendo. Mas a não discriminação do que é o que, coloca-nos perante um dashboard de resultados hospitalares inespecíficos (isso quando os hospitais medem resultados). E pode causar a falsa percepção de que determinadas iniciativas geram resultados que na verdade são gerados predominantemente por outras.

Defendo que não necessariamente mude qualquer coisa na prática, mas que tentemos isolar efeito de intervenções, e o ponto de partida é definição. Somente assim poderemos discutir alocação de recursos de forma responsável, e isso é maior e mais importante que a MH. Um grupo de hospitalistas em enfermaria com pacientes mais demandantes de cuidados de enfermagem e fisioterapia do que de medicalização poderia não ser custo-efetivo, e a opção pelo modelo tradicional representaria a melhor escolha para o hospital, liberando recursos para outros investimentos, como em reabilitação e cuidados paliativos. Não é isso o tal cuidado centrado no paciente?

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