quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Quem sou eu?

Sem falta modéstia, fui o primeiro e principal responsável por promover hospitalistas no Brasil (2004-2014): http://slidesha.re/1nbuGs6.

Curiosamente, iniciei isto tudo sem ter "o hospitalista" como maior motivação. Com formação em Clínica Médica e Medicina Intensiva, e paixão pelo generalismo, sempre gostei mais da atuação hospitalar. Naquele momento, precisava de um caminho alternativo para lidar com três questões que me incomodavam:

a) A necessidade de um espaço melhor do que os que dispunha para defesa do generalismo (ainda sem convicção em ter um modelo específico como bandeira);

b) A relação de associações médicas com a indústria de medicamentos e tecnologias;

c) Descontentamento com as associações médicas tradicionais por pouca transparência, quando não por representarem organizações com donos, embora travestidas de entidades públicas (mesmo que de direito privado) e sem fins lucrativos.

Dei-me conta de "c" a partir de uma situação grave: residente foi convidado para diretor de associação médica, em processo com eleições de fachada. Antes e enquanto foi diretor, nunca pagou anuidade como os "médicos comuns". Entrou pela porta dos fundos e, poucos anos após, simplesmente saiu - sem ter sido sócio de fato daquela estrutura em nenhum momento de dois mandatos "oficiais". O residente era eu.

Na época do convite inicial, não dei a mínima importância. Sequer pensei nisto, lembro apenas de ter me sentido bastante envaidecido. Fui tão responsável pela ilegalidade como quem dava as cartas na organização. A vida como ela é...

Logo em seguida, independente de qualquer conglomerado médico ligado às minhas especialidades, fui aos poucos desenvolvendo o movimento hospitalista. Embora desconfiado de que a estruturação a partir de outra associação talvez não fosse o melhor caminho, fui convencido por parceiros de que era o único viável. Desconfiança não apenas porque percebia a MH muito mais como um modelo de gestão/atuação médica, do que como uma especialidade tradicional, mas principalmente em razão de experiências prévias, em mais de uma associação, onde presenciei, quando não fui até conivente, disputas e jogos de poder improdutivos ou perversos, situações de golpes e fraudes.

Ao longo do movimento hospitalista, novos fatos interessantes aconteceram. Em meio à organização de evento em outro país da América Latina, passei a perceber novamente a presença da indústria além do que gostaria.

Optei, naquele momento, por não criar caso. Disse que estaria "junto, mas separado":

"Hi everyone!
I will be with you.
Just to remember that, because I´m the coordinator in Brazil of a campaign that debates the relation between doctors and pharmaceutical industry (www.campanhaalerta.com.br), I can´t receive any kind of benefit from Sanofi-Aventis. This won´t go to modify anything. My team should cover our costs, including at the "jantar com show típico
". But we would like to do everything with you!
I miss you guys and I´m glad we´re making plans togheter again.
Guilherme"


Esta foi uma das respostas que recebi:

"I understand your position G, but we the [nome de importante instituição norte-americana] group will be happy to accept the Pharma largesse".

Por que um médico brasileiro com salário no mínimo 5 vezes menor pode pagar o seu jantar e alguém de lá não?

Depois de uma reeleição na entidade hospitalista que criei, tendo sido inclusive seu mantenedor/patrocinador quase que exclusivo inicialmente, e para as coisas mais importantes, como seu site, só tinha um caminho a seguir, para manter coerência: passar o bastão. Disse-me um amigo: “Só tens a ganhar. Ou mostras que abristes caminho para algo diferente. Ou poderás investir em via alternativa para promoção do hospitalista e teus ideais, sem questionamentos”. Pois repetiram-se falta de transparência, uso questionável de dinheiro coletivo (se não meu), desrespeito a estatuto e supressão de eleições. Hoje não mais atuo em associações médicas brasileiras, a não ser que me surpreendam com transparência modelo e mecanismos para efetiva participação dos membros, e não controle.

Dos dez anos apresentados em http://slidesha.re/1nbuGs6, apenas dois tiverem vínculo com o CNPJ que deixo para trás.

Para onde as coisas irão ali a partir de 2014 não sei. Provavelmente atingirão novo equilíbrio que trará destaque para operadores do viciado, mas comprovadamente eficaz, modus operandi "tradicional". Estrutura que tão bem acomoda certos líderes, apoiadores de ocasião e a conhecida massa acrítica. Atingi maturidade para viver longe disto. E para saborear o pequeno alcance do que é feito diferente.

Futuro sombrio pelas "vias tradicionais"? Não sejamos pessimistas. Levando-se em conta grande parte do que critico, não será muito diferente do que costuma ocorrer em tantas outras entidades médicas. E com boas perspectivas, agora, de valorização do clínico e do generalismo. Houve inegavelmente um ganho recente através de pacto e entrega do movimento que me acompanha para a liderança de alguém que, embora - sob perspectiva bastante pessoal - não trabalharia junto ou seria co-responsável legal por projetos, é do perfil que realiza. Diferente do que ocorreu antes, onde perdeu-se tempo com quem apenas buscava um nicho de mercado e outro que vive exclusivamente de "política médica", abre-se possibilidade de promoção do modelo por quem o conhece e admira, estuda qualidade e segurança, e é capaz de materializar eventos, cursos e outras iniciativas semelhantes, contexto específico onde conta até mesmo com minha (muito seletiva) admiração.

Este texto foi atualizado em 18/05/2014

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